quinta-feira, 29 de março de 2012

Não faz assim.

Tudo que eu menos queria era acordar, mas nada é como agente quer. Estendi a mão ainda de olhos fechados sentindo os lençóis vazios mas uma rosa posta sobre o travesseiro onde ela deveria estar. Sentei, trazendo ela ao meu rosto e sentindo o cheirinho me invadir e os pensamentos -mais que corretos- me acusarem. 

Catei um camisetão no roupeiro e me sentei na mesa da cozinha, ajeitei na maior preguiça um café e somente o café .. me olhei no reflexo do fogão, beberiquei o liquido preto me comparando a borra no filtro do café, suja, falsa. Fechei os olhos murmurando um 'idiota' pra mim mesma e me dirigindo pro banheiro. Tentei, juro que tentei me esconder debaixo de 45 minutos de água quentinha, mas infelizmente isso não ajudaria.

Toda aquela merda tinha voltado e eu não conseguia mais tirar os pensamentos dela, dos olhos azuis, das tatuagens, dos gemidos, daquela mulher. Por que essa porra de amor tem que voltar? Perguntei me xingando mentalmente por fazer uma pergunta tão difícil.


(...)


Ajeitei a camisa do uniforme e dei uma ultima tragada no cigarro, jogando-o dentro do bueiro. Não tinha, definitivamente, ânimo pra trabalhar ... mas ser demitida agora não seria o ideal. Longas horas, e eu ali atendendo feito um zumbi as muitas (por que?) pessoas que chegavam, me abaixei pegando um bloco e ouvi uma voz, A voz, dela, dos olhos azuis que encontrei assim que levantei.

A- Que cê ta..aaa fazendo aqui?
C- Vim te ver.
A- Como sabe onde eu trabalho? 
C- Tenho meus modos de descobrir.

Olhei pra loja (milagre) vazia e voltei os olhos mais que nervosos pra ela.

A- Cê tem noção da merda que vai dar se alguém contar pra Rafa que você veio aqui? Ou ela mesma me ver com você?
C- Eu sei (baixou os olhos jogando minha caneta entre os dedos, de um lado pro outro}Mas eu queria conversar contigo.
A- Mas aqui não dá.
C- Na minha casa?

Mordi o lábio imaginando e tendo a certeza no que acabaria essa dita conversa .

A- Ta meu, só ... agora vai, eu passo depois do serviço lá.
C- Vou te esperar.

Se debruçou sobre a bancada e me roubou um selinho descaradamente. Corei olhando pros lados, rezando pra que ninguém tivesse visto. E me deixei cair sentada na cadeira. Todos os meus pensamentos gritavam a mesma coisa, a uma velocidade incrível. 'Sou uma cretina de marca maior'. Mordi o lábio aguentando firme as ultimas 3 horas que me restavam na loja, antes de ir encontrá-la.

Acendi o cigarro olhando firme pra mesma janela do dia anterior, claro que não era a dela, mas me fazia lembrar da tarde que passamos, tentei desistir, tentei me forçar a ir embora, mas lá estava eu com o dedo na campainha dela. Fitando os olhos azuis donos do corpo que estava estupendo dentro da cueca preta boxer, suspirei deixando-a me puxar pra dentro e me sentei no sofá, fingindo ela não estar com aqueles trajes.

A- Qual é o assunto?
C- Como assim 'qual o assunto'??? Agente porra, você ... (pigarreando) você acha que é assim, me deixa te amando por todos esses anos, agente se encontra, se ama ... e você acha que não temos nada pra conversar?
A- Ei, ei ... calma. Você tem que entender que eu tenho a Rafa, você foi embora ... você decidiu me deixar.
C- Você decidiu por ela antes.

Engoli em seco cruzando minhas mãos num nervosismo sem explicação. Olhei pra ela, suspirando envergonhada.


A- Eu ...
C- Você ... ?

'A Cara, não faz isso, não me obriga, você sabe, sabe que te amo, que te quero, que eu preciso de você, que minha pele, meu coração ta gritando por você desde ontem, eu realmente não preciso dizer isso.' Pensei comigo, mas não consegui falar, travei ... naqueles olhos azuis de sempre.

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